segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Projetos Sociais para crianças carentes em Porto Alegre


A Secretaria de Esportes, Recreação e Lazer (SME), tem desenvolvido nos últimos 5 anos de gestão, projetos sociais que visam a inclusão social de crianças carentes através do esporte.

De acordo com os indicadores demográficos e estatísticas do IBGE, mais de 21,43% da população total de Porto Alegre tem entre 0 e 12 anos de idade. É na Capital, com tradição na área da recreação pública, que a SME desenvolve atividades recreativas em praças, parques e centros comunitários, criando projetos e programas que visam ampliar e descentralizar os serviços prestados, facilitando o acesso da população.

Dentre os projetos, destaca-se o Programa Graxaim, criado em 1996, para atender crianças de 2 a 6 anos de comunidades carentes que não tem a oportunidade de frequentar uma creche.

O Projeto Brincalhão (que atende crianças de todas as idades) é um ônibus itinerante que passa pelos principais pontos e bairros de Porto Alegre, buscando crianças para brincarem à bordo do ônibus, equipado com livros e atividades recreativas em geral, orientados por estagiários de esucação física.

Para ampliar a faixa etária atendida e proporcionar novos espaços para brincadeiras, foi criado em 1997 o Projeto Brinquedoteca, que funciona atualmente no Parque Ramiro Souto, na Redenção, Centro de Comunidade Primeiro de Maio, no bairro Santa Maria Goretti e no Centro de Comunidade da Restinga, no bairro de mesmo nome.

"Brinquedoteca é um espaço preparado para estimular a criança a brincar, possibilitando o acesso a uma grande variedade de brinquedos, dentro de um ambiente especialmente lúdico." (Friedmann, 1992, p.36) Porém, com a dificuldade de expansão desse atendimento e à limitação de recursos humanos e materiais, surge a alternativa da Brinquedoteca Itinerante.

E por fim, o Projeto Social Esporte Clube, que conta com a parceria de mais de 12 clubes esportivos da capital para oferecer vagas nos clubes às crianças de 4 a 16 anos nos clubes em diversas modalidades esportivas.

Outras informações podem ser obtidas em horário comercial, pelos fones 3289-4864 e 3289-4865 ou pelo e-mail sme@sme.prefpoa.com.br

Crianças: limites ou horizontes? por Danilo Gandin




Quando hoje, se debate a escola, muito se fala em limites e em punição. Livros e artigos são gastos em grande quantidade para estimular pais e educadores a dar limites a filhos e a alunos e a puni-los se infringirem uma regra.

Esta volúpia pelos limites sempre acontece quando a sociedade ou algum de seus setores entra em crise. A crise é aquele momento em que, como diz Walter Benjamin, a hierarquia de valores existente já não dá conta das questões que surgem e a nova hierarquia que está se formando não mostrou ainda seus resultados. É um tempo de busca de novos rumos. Mas é, também, um tempo em que parte grande das pessoas se agarra, como forma de buscar segurança, à manutenção das regras que supostamente trouxeram bons resultados em outra época. É como se tivesse havido um naufrágio e, enquanto algumas pessoas nadam rumo a um novo navio que se vislumbra por entre a névoa, outras se agarram fortemente a uns pedaços do navio antigo que vão e vêm no balanço das ondas.

Na crise, as pessoas se tornam agressivas. A última grande crise da humanidade, afora esta de agora, aconteceu ao final da Idade Média. Houve um momento – veio aos poucos e foi muito longo – em que os ânimos se exaltaram e as pessoas se dividiram entre as que apontavam para o novo barco e as que queriam manter-se sobre os destroços do anterior. Os que detinham o poder tentaram, até com violência extrema, manter o status quo, mas a renovação foi feita porque ela tinha uma força intrínseca inabalável.

Hoje, a escola – só estou falando de educação básica – está em crise. Do ponto de vista dos resultados que aparecem nas avaliações periódicas, é muito difícil defendê-la; enquanto processo, “passa” um conteúdo muito formalizado e restrito, utiliza como metodologia fundamental a fala do professor, é mais autoritária do que a sociedade em geral, reprova os alunos, desdobra-se em séries e em disciplinas... Construir um conteúdo que seja uma vivência de valores, um desenvolvimento de habilidades e um acréscimo de conhecimentos gerais sobre a natureza e sobre a sociedade é nadar rumo a um novo navio que precisa ser construído na instabilidade; firmar-se no já vivido, na reprodução conservadora da sociedade existente, é agarrar-se às tábuas soltas de um navio já naufragado.

Querer limites é lutar pela volta ao que já se fez, ao que já se viveu, ao que se pensa que deu certo, embora se saibam os resultados da desigualdade social e os resultados pobres no saber e na aprendizagem. Abrir horizontes para crianças e adolescentes é crer na capacidade humana de construir e de construir-se. De fato, crianças e adolescentes necessitam, para crescer, além de ser amados, conviver com adultos que saibam o que querem e para onde estão indo. À escola cabe fundamentar e tornar éticos os primeiros horizontes da ciência, da política, da fé, da linguagem, enfim de toda a cultura.

O que leva um pai ou uma mãe a esquecer um filho dentro de um carro?

A história de Vilma, a mãe que esqueceu seu bebê no carro na tarde de quarta-feira (dia 17) e acabou sendo responsável pela morte da criança, não é inédita. Só em 2006, 2007 e 2008, ocorreram três casos parecidos no Brasil, todos eles atribuídos a uma mudança de rotina. Mas o que leva uma mãe a esquecer seu bebê dentro do carro por um longo período?
Segundo a psicanalista Elizandra Souza, essa situação poderia acontecer com qualquer mãe. Ela explica que quando a pessoa segue uma rotina muito regrada, essa sequência de atividades torna-se automática no cérebro. Por exemplo, o caminho que a pessoa faz diariamente para ir da casa à escola dos filhos e depois ao trabalho. Uma simples alteração nessa rotina pode atrapalhar esse sistema “automático”, causando falhas na nossa memória.

Lapsos de memória como este são comuns em pessoas que vivem sob pressão no trabalho, têm muitas responsabilidades, muitos afazeres e vivem em constante estresse. Preocupações demais, aliadas a uma escapada na rotina, podem gerar lapsos, o que geralmente acontece com qualquer um, mas não damos tanta importância. “Assim como nos esquecemos de ir ao banco, de entregar algo para alguém, de trancar a porta ou de fazer alguma tarefa, a mãe que esqueceu a criança no carro também sofreu um lapso, só que com uma consequência muito mais desastrosa”, explica a Dra Elizandra. “Provavelmente, na cabeça dela, ela tinha uma memória projetada de que havia deixado a bebê na creche e depois seguido para o trabalho. Vivemos de uma forma tão sistemática que qualquer alteração nesse sistema nos deixa atrapalhados, até mesmo um feriado na segunda-feira, por exemplo”.

É claro que casos como esse são tragédias que nem imaginamos que podem acontecer com a gente, mas alguns cuidados podem ser úteis para evitar este tipo de acidente. Um deles é colocar em seu carro um retrovisor ajustável, feito para os adultos conseguirem ter uma boa visualização da criança que está no banco de trás. Outra saída é ter horários fixos, todos os dias, para você falar com seu companheiro, mãe, sogra, babá. Assim, você separa alguns minutos do seu dia para deixar de lado os pensamentos sobre o trabalho e garantir que está tudo bem. Se naquele dia foi o pai que levou as crianças pra escola ou o bebê pra creche, por exemplo, não custa nada perguntar: as crianças foram bem pra escola?, o bebê chorou pra entrar na creche?, e assim por diante. A ideia não é fazer terrorismo, e sim uma forma de fazer com que a mente faça uma retrospectiva daquele dia - e evitar um acidente que pode ter consequências ruins pra família toda.

sábado, 28 de novembro de 2009

Distraído demais




Quando a falta de atenção da criança indica problema


Algumas crianças vivem distraídas, parece que estão fora de órbita. Não conseguem prestar atenção na aula. O olhar vagueia, passa pela janela. Acabam tirando notas baixas. Em casa, a mãe chama e elas não respondem, simplesmente porque estavam tão desatentas que não ouviram. Costumam ser chamadas de preguiçosas, retraídas e até burras.
O que muitos pais não sabem é que esse comportamento pode indicar a desordem de déficit de atenção (DDA), um distúrbio em geral associado à hiperatividade e que costuma passar despercebido na criança que não tem esse problema. "Por não incomodar tanto quanto a criança hiperativa, que é mais elétrica, essa fica anos sem diagnóstico, recebendo o rótulo de preguiçosa.
O resultado são anos de prejuízo escolar sem nenhuma suspeita de que se trata de um problema de saúde, e não apenas de temperamento", diz o psiquiatra Luís Augusto Rohde, professor de psquiatria da infância e adolescência da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, co-autor de Terapia Cognitivo-Comportamental no Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (Editora Artmed, 2002).

As causas
Ter dificuldade em prestar atenção quando estamos cansados, com muitos compromissos ou estressados é normal. Mas o filho que é desatento a maior parte do tempo, e isso se reflete no desempenho escolar e em seus relacionamentos sociais, pode apresentar DDA (veja quadro). As causas são orgânicas, emocionais e genéticas. Se a criança apresenta pré-disposição para o problema, fatores ambientais, como conflitos familiares e métodos educacionais inadequados, podem desencadear a DDA. "Estudos indicam que sofrimento perinatal, assim como álcool e fumo na gravidez, também, podem causar o transtorno", afirma Rohde.

Auto-estima
Apesar de inteligentes, a falta de atenção faz com que as crianças com DDA fiquem atrás dos colegas de classe. O índice de repetência é até três vezes maior. "Isso afeta diretamente a auto-estima da criança. Cerca de 10 a 20% delas podem desenvolver depressão", observa o psiquiatra.
Para a psicóloga e psicopedagoga Nivea Fabrício, o professor deve ter um olhar diferenciado sobre o aluno com DDA e, em alguns casos, reavaliar seu método de ensino. "É importante saber quais são os interesses da criança para trazê-la de volta para a sala de aula. Assim, o retorno é garantido."

Conheça os sinais
Se o seu filho apresenta os sintomas abaixo há, pelo menos, seis meses, é aconselhável buscar ajuda especializada.
Copia matéria no caderno errado.
Não ouve quando é chamado.
Perde objetos com freqüência.
Erra exercícios escolares por descuido. A atividade pede que ele marque a alternativa incorreta e ele assinala a correta.
É mais desorganizado que o esperado para a idade.
Distrai-se com facilidade.

Abaixo, um vídeo do Projeto Sinapse sobre o uso da medicacão para o tratamento de DDA

sábado, 21 de novembro de 2009

Dez dúvidas sobre viroses em crianças

Leia as respostas para as dúvidas mais comuns

O dia chega ao fim e seu filho começa a ficar dengoso e sem vontade de brincar. Durante a noite, está com febre, dores no corpo e coriza. E na hora do diagnóstico, você ouve sempre a mesma palavra: virose. Para o desespero dos pais, isso se confirma. Há milhões de vírus espalhados no ar, que causam desequilíbrios parecidos no organismo. Leia a seguir as respostas para as dúvidas mais comuns


1. Por que o primeiro diagnóstico dos médicos é sempre virose?
É mesmo difícil aceitar que todo mal-estar, febre, vômito, diarreia, coriza e dores no corpo seja virose. Mas os médicos têm razão. Há milhões de vírus espalhados pelo ar que causam infecções. Os mais conhecidos são a gripe e o rotavírus, mas não é possível conhecer e denominar todos os que existem. Ao examinar a criança, o médico é capaz de perceber o estado geral e identificar se há sinais de doenças mais complicadas. Quando essa possibilidade é descartada, ele constata que se trata de uma virose, já que a probabilidade de se contaminar pelo ar é grande.
2. Por que a maioria dos médicos não pede exames para ter certeza de que se trata de uma virose?
Os exames laboratoriais são dispensados, em geral, porque o organismo da criança costuma se livrar do vírus em poucos dias, antes até de os resultados ficarem prontos.
3. Existem vacinas contra viroses?
Sim. Para os vírus mais comuns, como os que transmitem gripe, catapora, sarampo, hepatite A e B e rotavírus, há vacinas que podem ser tomadas a partir do 2o mês de vida. Entretanto, para a maioria, ainda não existe vacina. Por isso, o único jeito é amenizar os sintomas e esperar que o organismo se recupere sozinho.
4. Como devo agir assim que se apresentarem os primeiros sintomas?
Antes de mais nada, converse com o pediatra da criança. Os primeiros cuidados variam conforme a idade. Se a criança já completou 1 ano, o ideal é observá-la por 48 horas antes de levá-la ao consultório. Antes disso, é difícil até para o médico fazer o diagnóstico, já que os sintomas da doença não aparecem imediatamente. O tratamento pode incluir desde a adoção de um antitérmico até lavar o nariz com soro fisiológico e fazer inalação. Ofereça bastante líquido para afastar o risco de desidratação. Evite levar a criança correndo ao pronto-socorro, sem antes ter consultado o pediatra. O ar dos hospitais está cheio de vírus e, com o sistema imunológico mais frágil, seu filho pode piorar. Faça isso somente se ele não apresentar melhora com os seus cuidados e medicação. Nos menores de 1 ano, a atitude deve ser outra: não dá para esperar. Como eles não expressam a dor e o mal-estar com clareza, é melhor consultar o pediatra e, se não conseguir, levar a criança a um pronto-socorro pediátrico.
5. Como saber se o que o meu filho tem não é uma doença mais séria?
Pelo estado geral da criança. Quando ela está caída, desanimada, mesmo que com febre baixa, a situação pode indicar algo mais complicado do que se ela estiver com febre mais alta e brincando normalmente. Além disso, os pediatras seguem uma lista de procedimentos médicos ao examinar a criança que podem apontar sintomas de outras doenças mais graves, como meningite e sarampo.

A era dos adultos infantilizados


Para começar as postagens do blog, sugiro a leitura da reportagem de Eliane Brum, da revista Época, para refletirmos que pais somos:





Eliane Brum,
reporter Revista Época


"Na semana passada, um amigo me enviou um email com o anúncio de um personal organizer. Ele sugeria que eu contratasse um desses “profissionais” para arrumar a minha mesa. Era uma sacanagem, claro. Eu detenho o título de autora da mesa mais bagunçada da Época desde que entrei na equipe da revista, em janeiro de 2000. Nesse quesito, sou imbatível. Na minha mesa, é possível encontrar, convivendo ecumenicamente lado a lado (ou um em cima do outro), um saco de salgadinhos, uma imagem de São Francisco de Assis, uma lagosta de borracha e um dicionário de sinônimos. Isso em apenas um cantinho. Às vezes preciso escrever com os cotovelos grudados no corpo, porque não tenho outro lugar para apoiá-los. Embora venha cogitando ter uma mesa organizada há umas duas décadas, na minha bagunça pessoal eu acho tudo e não perco nada – ou quase nada. É o meu jeito.

Mas há algo bem interessante na brincadeira do meu amigo. A multiplicação de termos como personal e coach diz muito sobre a época em que vivemos. E sobre os adultos que nos tornamos.

O conceito de infância, como o conhecemos, se consolidou no Ocidente a partir do século XVIII. Até o século XVI, pelo menos, assim que fossem desmamadas e conseguissem se virar sem as mães ou as amas, as crianças eram integradas ao mundo dos adultos. E, como tal, eram responsáveis pelas consequências de seus atos. A infância, como idade da brincadeira e da formação escolar, ao mesmo tempo com direito à proteção dos pais e depois à do Estado, é algo relativamente novo.

Nem sempre as crianças significaram a promessa para o futuro tanto de uma família como de uma nação. A infância não é um conceito natural ou determinado apenas pela biologia. Como tudo, é também ou principalmente uma invenção cultural, um fenômeno histórico implicado nas transformações econômicas e sociais do mundo dos humanos, em permanente mudança e construção.

Me parece que hoje há algo novo nesse cenário. A partir do século XXI, vivemos a era dos adultos infantilizados. Uma espécie de infância permanente do indivíduo. Não é por acaso que os coaches proliferam. Coach, em inglês, significa treinador. Originalmente, treinador de times e de esportistas. Mas que foi ampliada para treinador de tudo, inclusive de como viver: os life coaches. Personal trainers têm função semelhante. Treinar alguém para se exercitar, comer, se vestir, namorar, conseguir amigos e emprego, lidar com conflitos matrimoniais e profissionais, arrumar as finanças e também organizar os armários e a mesa de trabalho, como na sugestão do meu amigo.

Nesses conceitos importados dos Estados Unidos, o país que transformou a infância numa bilionária indústria cultural e de consumo, a ideia é a de que, embora estejamos no que se convencionou chamar de idade adulta, não sabemos lidar com nenhum aspecto da vida sozinhos. Coaches e personal trainers podem ser eufemismos para uma função muito parecida com a da babá. Crescemos, terminamos a escola, constituímos família ou não, vamos para o mercado de trabalho, mas precisamos de alguém que arrume nossa mesa e nossa casa, nos ensine a comer direito, nos diga como namorar e conseguir amigos, nos treine para impressionar o chefe e conquistar uma promoção. Nos ensine, em programas diários, semanais, mensais e anuais, como num planejamento das metas de uma empresa, a viver, como no caso dos life coaches.

Ao nos reduzirmos a adultos que precisam de babás por total incapacidade de lidar com qualquer aspecto da vida, do sentimental ao profissional, a que renunciamos? A muito. Mas o principal é que renunciamos à responsabilidade. A construção contemporânea de infância está fundamentada no conceito de que, tanto no estatuto social quanto no jurídico, crianças são seres com direito à proteção e à educação – mas sem responsabilidade pelos seus atos. Crescer, tornar-se adulto, é justamente passar a responsabilizar-se pelos seus atos. Mas, no caso das novas gerações de 20, 30, 40 anos, se isso ainda vale para o estatuto jurídico, parece perder força no estatuto social.

Os adultos desse início de milênio parecem prolongar a infância no sentido da não-responsabilização. São sinais, aqui e ali, de uma transformação na forma de ver a si mesmo – e de ser visto. É corriqueiro testemunhar, seja no bar ou na empresa, gente que fica muito surpresa porque seus atos motivaram uma reação indesejável, uma conseqüência pela qual precisam responder. Nesse momento, vemos adultos com cara de surpresa, olhos arregalados como os de uma criança. Parecem pensar: “Mas por que eu, que sou tão bacana, tão inteligente, tão cool?”. Quando podem, chamam os pais, os advogados.... os coaches para salvá-los. A expectativa, como um direito adquirido, é a de que sempre serão “perdoados”.

Da mesma maneira, encarnam a geração do “eu mereço”. Se não há responsabilidade pelos seus atos, também não há responsabilidade pelas suas conquistas. Está cada vez mais diluída a ideia de trabalhar por aquilo que se quer com a consciência de que custa tempo, esforço, dedicação. Escolhas e também perdas, frustrações. Alcançar sonhos, ideais ou mesmo objetivos parece ser compreendido como uma consequência natural do próprio existir, de preferência imediata. É uma espécie de visão contemporânea da ideia mística de destino, de predestinação. Ou apenas uma questão de usar a estratégia certa. E, para nos ensinar a traçá-la, buscamos um business coach.

O “eu mereço” vem a priori. “Eu mereço porque eu sou eu”. Ou: “Eu existo, logo mereço”. O fazer por merecer foi eliminado da equação. Quando essa crença, tão fundamentalista quanto os preceitos de algumas religiões, fracassa, aí é hora de buscar o happiness coach (treinador de felicidade), o dating coach (treinador de relacionamentos amorosos), o health coach (treinador de saúde), o conflict coach (treinador de conflitos matrimoniais e profissionais), o diet coach (treinador de alimentação saudável). O life coach. É estarrecedor verificar como as gerações que estão aí – e as que estão vindo – parecem não perceber que a vida é dura e dá trabalho conquistar o que se deseja. E, mesmo que se esforcem muito, haverá sempre o que não foi possível alcançar.

Muito se tem falado e escrito sobre a falta de limites das crianças de hoje. E aqui o “de hoje” faz realmente sentido. A partir da constatação de que as crianças não param quietas um minuto, em lugar nenhum, a psiquiatria criou síndromes no mínimo curiosas. A indústria dos medicamentos estimulou a disseminação de drogas no mínimo questionáveis. Foram tecidas teses de todo o tipo, algumas delas bem estapafúrdias. Ou no mínimo curiosas.

Afinal, os professores choram em sala de aula pela prepotência dos alunos. E ninguém mais aguenta crianças berrando nos restaurantes, falando nos cinemas, atropelando nos corredores. Eu, que sou bem pouco tolerante não só com crianças mal-educadas, mas com gente mal-educada, em geral reclamo. Os pequenos e rosados pimpolhos costumam me olhar com os olhos estalados: “Mas eu sou tão fofo! Por que você não gosta de mim?”. E as mães, indignadas por eu não me render ao encanto de seus rebentos, também me olham ofendidas: “Mas ele é tão fofo! Todo mundo gosta dele. Você deve ter algum problema!”. E lá vem a ofensa predileta para atingir uma mulher: “Sua mal-amada!”.

Para além das boas hipóteses das muitas teses e debates sobre o fenômeno da infância insuportável, me parece que vale a pena pensar sobre quem são os pais dessas crianças. Se os pais são adultos infantilizados, que não conseguem se responsabilizar pelas suas vidas – e muitos nem acham que precisam... –, como esperar que suas crianças se responsabilizem? Como esperar que os pais sejam pais se continuam sendo filhos?

Esses pais continuam sendo filhos ao não responsabilizarem-se pelas suas vidas. Ao permitir que seus filhos façam o que bem entendem, não só dentro de casa, mas no espaço público, estão escolhendo o que dá menos trabalho. Sim, porque educar, botar limites, se importar, dá muito trabalho. E exige tempo, gasto de energia, esforço. Amor. O mais fácil é deixar para lá. Ou bater a porta da rua e deixar que a babá – a de seus filhos – se vire. Mas há algo mais.

Me parece que a permissividade com os filhos é uma permissividade consigo mesmo. Se os filhos encarnam o ideal dos pais, se neles estão colocados os desejos e as melhores esperanças dos pais, não seria de esperar que o ideal de pais infantilizados seja o de que os filhos possam tudo? Bem ou mal, ainda que andem pelo mundo como se não tivessem responsabilidade nem por si mesmos nem pelos destinos do planeta, em alguma medida esses adultos precisam lidar com as consequências de seus atos – ou não-atos.

É de se esperar que, para os filhos, desejem, consciente ou inconscientemente, que possam fazer tudo sem nenhuma espécie de retaliação. Aos filhos, tudo deve ser permitido. Algo como: “se para mim não está sendo assim, que pelo menos seja para os meus filhos”. Um ideal tão óbvio como é o desejo que os filhos se formem na universidade para os pais que não puderam estudar ou que o filho tenha casa própria para os pais que viveram a vida inteira de aluguel.

Desde que a infância se tornou um depositário do futuro, os pais desejam que os filhos realizem aquilo que não puderam realizar. Não seria lógico que os pais que se tornaram adultos sem se responsabilizar pela vida – sem sair da infância, portanto – desejem que os filhos possam fazer tudo? Nesse sentido, é ainda mais grave do que parece: ao permitir tudo, esses pais estão fazendo o melhor que podem para o cumprimento de suas mais caras esperanças.

Há muito para pensar. E, por enquanto – ufa! – ainda não inventaram um think coach.

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